quarta-feira, 10 de junho de 2015

Sobre o Paradoxo de Abilene

De acordo com o dicionário online Michaelis, paradoxo é uma afirmação de um conceito mediante aparentes contradições ou termos incompatíveis. Ou, em outras palavras, é alguma coisa com falta de nexo ou de lógica.

Se o medo costuma levar você a dizer sim, para uma proposição colocada em grupo, quando a resposta verdadeira é não, de acordo com o que você pensa e sente, isso significa que você está passando por uma situação típica do paradoxo de Abilene. É difícil dizer não e colocar-se contra uma ideia que nasceu com o grupo e com a qual aparentemente todos concordam. Ninguém gosta de ser o “cara do contra”, ou a “garota chata e teimosa” que trava o andamento do grupo porque não concorda com nada. Sim, os rótulos são rapidamente distribuídos. Você olha para o lado e imagina o seu colega de empresa lendo a etiqueta imaginária que está colada bem no alto da sua testa e diz: “mala sem alça”.

Mas, pensando um pouco mais, não seria melhor para uma organização se seus colaboradores fossem capazes de prevenir o falso consenso? Não seria melhor deixar os rótulos de lado e se permitir conhecer realmente o ponto de vista dos outros? Não seria essa uma forma de melhorar a comunicação do grupo? Bem, parece que sim. Para isso é preciso vencer esse medo da rejeição do grupo e da critica alheia que estão na essência do paradoxo de Abilene.
O grande escritor brasileiro Nelson Rodrigues escreveu que “toda a unanimidade é burra”. Essa frase dá uma excelente pista do que vamos debater nesse post.

O paradoxo de Abilene foi enunciado por Jerry Harvey, professor e especialista em dinâmica de grupos e gestão organizacional. A situação que este paradoxo aborda é a de um indivíduo que toma uma decisão com base na suposição de que o grupo pensa de um certo modo. Esse indivíduo pensa que está concordando com o grupo e aí decide de modo alinhado com o grupo (pelo menos ele pensa que está fazendo isso). Ele faz isso para obter aceitação ou para não sofrer censura. No paradoxo de Abilene todos agem e decidem pensando da mesma forma, considerando que estão concordando com o grupo. O prof. Harvey usa o exemplo de uma família que mora em uma pequena cidade no estado do Texas, chamada Coleman, e estava tranquila, tomando limonada e jogando dominó. Então, essa família decide viajar para a cidade de Abilene, que fica a aproximadamente 85 Km de distância de Coleman, somente para jantar. Todos parecem concordar. A viagem é longa, empoeirada e quente. Quando chegam ao restaurante, a comida é tão ruim quanto a viagem. Eles voltam para casa quatro horas depois, exaustos. Bem, essa é só a espinha dorsal da estória sobre a qual as situações que destacam o paradoxo de Abilene são apresentadas.
Nesse ponto vale mencionar o treinamento chamado ABILENE PARADOX 2ND EDITION, desenvolvido pela empresa norte-americana CRM Learning,  cujo trailer do video desse treinamento pode ser assistido no início do post. O video – com legendas em português - ilustra as situações do paradoxo aqui tratado, incluindo além da estória da família que foi jantar em Abilene mais duas situações. Uma delas se refere a uma empresa que está debatendo um novo projeto, proposto por seu principal diretor, para desenvolver uma nova forma de transformar óleo de amendoim em combustível de jato. A outra situação trata do pedido de casamento que George faz para Sue. É claro que, como dissemos, trata-se apenas de um trailer, e não do video completo. Mas, apesar disso, não será surpresa se o leitor identificar similaridades entre as situações que ocorrem em sua vida pessoal e profissional com aquelas mostradas no video.

Diálogos em português (trailer do vídeo de treinamento da CRM Learning)
Em nossa vida pessoal e profissional, nada é mais satisfatório e compensador do que os conflitos com nossos amigos e colegas de trabalho, ou não ...
Pai: - Tudo que podemos dizer é que vamos pegar o carro, ir para Abilene comer uma refeição e tomar um café.
Através da história engraçada de uma família, a CRM apresenta um treinamento que não trata de problemas causados por conflitos, mas que surgem com o consenso.
Gerente: - O que é o projeto X?
Diretor: - Um albatroz. Os caras lá de baixo do P&D (Pesquisa & Desenvolvimento) acham que podem transformar óleo de amendoim em combustível de jato.
Supervisora: - Óleo de amendoim virando combustível de jato. Só pode ser brincadeira!
Outro gerente: - Você vai tentar transformar óleo de amendoim em combustível de jato?
Gerente (falando com George): - Por que você vai se casar?
George: - Eu dei um anel para a Sue e agora vou me casar com a garota que eu amo.
Sue: - Se eu gosto dele? Na verdade, não sei se eu entendo ele ...
Mas como um consenso pode se tornar um problema, você pergunta? Tolice, quando não nos comunicamos uns com os outros.
Gerente (em casa, com a irmã): - O que você quer dizer com nós? Eu não queria ir.  Você estava de acordo.
Irmã do gerente: - Não diga isso de mim. Você, papai e mamãe queriam ir ...
Gerente (na empresa): - Porque você não conta para ele que essa é uma má ideia?
Supervisora: - Não, não eu! O projeto é uma vaca sagrada.
Pelo caminho, o paradoxo de Abilene expõe o medo racional que todos nós temos de emitir opiniões e ideias não populares.
Sue: - Mãe, nós não vamos nos casar.
Diretor: - Por sua falta de suporte ao projeto X você está demitido.
Outro gerente: - Me desculpe senhor, o que disse?
Diretor (em um momento diferente do diálogo anterior): - Eu disse que o projeto X pode estar com problemas.
Na verdade, o paradoxo de Abilene mostra que vamos estar em perigo se não nos comunicarmos corretamente.
Supervisora: - Estamos no Wall Street Journal novamente. (Acme Corp. reporta prejuízo recorde: Pesquisa recebe a culpa).
Outro gerente: - Ei, espere um minuto: Esse novo projeto não era para mim.
Diretor: - Quer apostar?
(Aqui o diretor reconhece que estava errado e que o “outro gerente” tinha razão. Por isso, como recompensa, o diretor decide dar esse novo projeto para ele).
O curso da CRM mostra que devemos ter a coragem de mostrar nossas convicções.
Outro gerente: - Eu honestamente não acredito que o projeto X vai funcionar.
Sue: - Eu não sei o que você está pensando George, mas eu não quero realmente me casar.
E mostra para nossas equipes e para nós mesmos como crescer.
Diretor: - Você compreende o que está dizendo?
Sim, o treinamento da CRM vai ajudar você e sua equipe a tomar melhores decisões em grupo.

O prof. Harvey destaca que a inabilidade de obter um consenso verdadeiro é um forte indicativo de uma empresa que está sofrendo com o paradoxo de Abilene. Essa inabilidade é apresentada em seis sintomas principais:
1. Os membros da organização concordam, individualmente, quanto à natureza da situação ou problema que enfrentam na organização. Por exemplo, os membros do grupo de Abilene concordaram que estavam se divertindo, sentados na frente do ventilador, tomando limonada e jogando dominó.
2. Os membros da organização concordam, individualmente, com as medidas que seriam necessárias para lidar com a situação ou problema que eles enfrentam. Para os membros do grupo de Abilene "mais do mesmo" (continuar se divertindo com o jogo de dominó) era uma solução que teria adequadamente satisfeito seus desejos individuais e coletivos.
3. Os membros da organização não conseguem comunicar com precisão, uns para os outros, os seus desejos e/ou crenças. Na verdade, eles fazem exatamente o oposto e, assim, levam o outro a não perceber a realidade coletiva. Cada membro do grupo de Abilene, por exemplo, transmite dados incorretos para outros membros do grupo. Eles dizem, falando da boca para fora, "- sim, é uma ótima idéia. Vamos para a Abilene ", quando na realidade sua preferência é para ficar em casa.
4. Com tais informações inválidas e imprecisas, os membros da organização tomam decisões coletivas que os fazem agir de forma contrária ao que desejam fazer. Isso os leva a resultados que são contraproducentes para os objetivos e propósitos da organização. Assim, o grupo acaba indo para Abilene quando, na verdade, teria preferido fazer outra coisa.
5. Como resultado da adoção de medidas que são contraproducentes, os membros da organização experimentam frustração, raiva, irritação e insatisfação com a sua organização. Consequentemente, alguns subgrupos (“panelas”) são formados (com pessoas que se conhecem, que confiam umas nas outras e são mais próximas). Cada subgrupo culpa o outro subgrupo pelo dilema da organização. Esse fenômeno é também mostrado no grupo de Abilene quando retornam da viagem.
6. Finalmente, se os membros da organização não aprendem a lidar com o problema, que reside na sua incapacidade de gerir o consendo, o problema se repete com intensidade ainda maior.    
Por tudo isso, é importante estabelecer estratégias facilitadoras no ambiente de trabalho que evitem ou minimizem o problema do paradoxo de Abilene. Algumas dessas estratégias estão relacionadas abaixo:

·         Os gerentes, supervisores e chefes devem encorajar os membros da equipe a expressar e compartilhar as suas opiniões;

·         A equipe poderia escolher um de seus membros para desempenhar o papel do avaliador crítico;

Aqui é importante entender que o trabalho do avaliador crítico é destacar criticamente as vantagens, desvantagens e principais atributos de uma sugestão, ideia ou outro tema em debate. Isso também ajuda os membros mais jovens a expressar livremente as suas opiniões como parte de sua contribuição para a organização. Todavia, o avaliador crítico não pode se apropriar do papel de crítico, como o único membro da equipe que pode criticar. Ele ou ela necessita ser alguém que dê abertura e oportunidade para outros membros da equipe de explorar as áreas de preocupação e expressar suas dúvidas.

·         A equipe deve também discutir os assuntos e ideias mais relevantes com outras equipes da organização, que poderão ter enfrentado uma situação similar. Conhecer as melhores práticas e lições aprendidas ajuda a ajustar o foco da equipe sobre a questão central.

·         A equipe pode eventualmente usar a figura do “advogado do diabo”, que seria atribuída a um determinado membro da equipe. O “advogado do diabo” é alguém que toma uma posição contrária. Este processo é usado para testar a qualidade do argumento original e identificar os pontos fracos na sua estrutura. Para escolha do “advogado do diabo” recomenda-se rotatividade entre os membros da equipe.
Vou finalizar esse post com a seguinte questão: Levando em conta o desafio do gerenciamento dos recursos humanos, qual seria o problema que mais pressiona uma organização? A sua incapacidade de gerir o consenso ou a sua enorme dificuldade de lidar com conflitos? Deixe o seu comentário!!!

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