quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Sobre o Termo de Abertura do Projeto

Os processos de gerenciamento de projetos são apresentados como elementos distintos com interfaces bem definidas. Entretanto, na prática eles se sobrepõem e interagem e, por isso mesmo, é tão relevante a integração do projeto! No PMBOK guide é possível encontrar uma importante área chamada “Gerenciamento da Integração do Projeto”, cujo primeiro processo é o de “Desenvolver o Termo de Abertura do Projeto”.
A designação Termo de Abertura do Projeto é a tradução ou a versão para o nosso idioma da expressão “Project Charter”, cunhada na versão original do PMBOK guide, em inglês.
Como dissemos anteriormente, a natureza integrativa do gerenciamento de projetos faz com que os processos interajam uns com os outros.  Na prática, para entender como esta interação acontece em uma empresa precisamos conhecer o jeito como as coisas funcionam – suas rotinas e processos (estando estes descritos / documentados ou não) - na organização. Em empresas diferentes podemos ter processos diferentes, culturas diferentes e níveis de maturidade diferentes em relação à gestão de projetos. Por conta disso, essa interação dos processos de gerenciamento de projetos pode ser diferente de empresa para empresa. Por isso, os gerentes de projeto mais experientes reconhecem que é necessário pensar antes de agir e que as coisas podem não funcionar exatamente como se espera ou se entende ao ler o PMBOK guide! Então, botando a cabeça para funcionar vamos, nesse post, fazer algumas reflexões sobre o chamado Termo de Abertura do Projeto, cujo desenvolvimento faz parte dos processos de integração do projeto.

 
Quando elaboramos o Termo de Abertura do Projeto, o que fazemos é desenvolver um documento que formalmente autoriza a existência de um projeto e dá ao gerente de projeto a autoridade necessária para aplicar recursos organizacionais às atividades do projeto.

Mas será que um projeto realmente começa pra valer a ser executado depois da emissão do termo de abertura? Esta parece ser a conclusão de muitos estudantes de gerenciamento de projetos. Afinal de contas, o “Project Charter” descreve o produto ou serviço que o projeto se propõe realizar e a necessidade que o projeto visa atender, incluindo a justificativa para a existência do projeto, sempre respaldado pelo alinhamento com o plano estratégico da organização. Dada a importância desse documento, deve ser criado e assinado pelo patrocinador (sponsor) do projeto, que é um gestor que está em um nível superior na escala hierárquica da organização.

Mas, insistindo na pergunta, será que conseguimos executar um projeto tendo apenas o termo de abertura? Bem, à rigor, a resposta a essa pergunta é não. Para executar um projeto é necessário primeiro planejar o mesmo. Mas, não devemos esquecer que esse planejamento dá um certo trabalho e, sem nenhuma dúvida, já gasta tempo, dinheiro e recursos da organização. Sim, mas é justamente para isso que serve o Termo de Abertura do Projeto. Com ele, temos a autorização para aplicar recursos organizacionais às atividades do projeto. A necessidade do planejamento é óbvia, mas não podemos esquecer que o Termo de Abertura do Projeto tem informações em alto nível, que é uma tradução da expressão inglesa “high level”, mas que significa em bom e claro português, alguma coisa sem detalhamento. Portanto, parece lógico não ser possível executar um projeto apenas com informações não detalhadas (o tal “high level”), sendo necessário antes trabalhar no planejamento do projeto.

Aí entra a seguinte questão: como a empresa autorizou um projeto tendo apenas informações não detalhadas? Não haveria um risco muito grande de cometer erros nas estimativas e estar considerando dados não confiáveis? Sim, e não, como veremos no decorrer desse post! Bem, nesse ponto considero que já foram criadas dúvidas suficientes e é o momento de por ordem na provável bagunça.

Em primeiro lugar, para emitir o Project Charter (Termo de Abertura do Projeto) é necessário ter primeiro aprovado o projeto. Esse é o ponto no qual a organização diz o seguinte: - “Okay, vamos fazer esse projeto”. Para chegar a essa conclusão, a empresa deve ter analisado a importância do projeto do ponto de vista dos benefícios que o mesmo traz para a organização (aumento de receita, expansão da capacidade produtiva, adequação de sistemas de informação à legislação vigente, otimização de processos, dentre muitos outros). Um “business case” costuma ser elaborado para servir de base de discussão sobre o projeto, apresentando os argumentos para sua aprovação, com detalhes sobre os investimentos no presente e as receitas no futuro, além de uma clara explicação sobre - quanto será, quando e como a empresa obterá - o retorno sobre o investimento.

Um projeto devidamente aprovado ainda precisa receber o sinal verde para iniciar a sua execução. Então, temos agora uma segunda decisão a tomar!

Há empresas que podem tomar essa segunda decisão – de iniciar a execução do projeto - usando estimativas não detalhadas (presentes no Termo de Abertura do Projeto), por possuírem dados históricos de outros projetos e a experiência do dia a dia que mostra um erro muito pequeno entre suas estimativas e os números dos projetos reais que implementam. A etapa de planejamento, que levará em conta a experiência acumulada das lições aprendidas, será bem mais rápida nesse caso.

Vamos citar, apenas para exemplificar, o caso hipotético de uma construtora de prédios residenciais que faz esses prédios ano após ano. Ela conhece o projeto arquitetônico e de construção civil de seus empreendimentos e o custo de tudo ou quase tudo na obra por metro quadrado (mão de obra, materiais, máquinas e instrumentos utilizados). Essa empresa conhece muito bem a sequência de atividades de seus projetos, bem como as durações de cada atividade. Além disso, essa empresa domina as técnicas empregadas no seu ramo de negócio.  Isso lhe dá uma segurança muito grande e reduz o risco do projeto. Essa empresa notou que nos últimos 10 edifícios construídos, a diferença entre real e planejado com relação as estimativas de custo e de prazos de conclusão das obras, foi menor do que 10%. Em outras palavras, quando uma empresa desse tipo faz uma estimativa, costuma cometer um erro pequeno e previsível.

Agora, vamos pensar em outro tipo de empresa, do tipo que precisa de mais detalhes para dar o sinal verde para iniciar a execução de um projeto previamente aprovado. Nesta ainda temos um “business case” que se mostrou bastante promissor, para um projeto que abrange várias áreas em que não há um domínio pleno por parte dessa empresa. Para a elaboração desse “business case” foi previsto um orçamento, foi estimado um prazo e definida a necessidade dos recursos, tudo isso relacionado ao projeto. Mesmo assim, ainda há muitas dúvidas. E não é difícil imaginar que tipo de empresa seria essa. Uma fábrica, por exemplo, que é especializada na produção de algum tipo de peça e usa um grupo de máquinas, conhece muito bem seus processos produtivos e a aplicação das peças que produz. Como qualquer organização, a empresa é especialista naquilo que faz! Entretanto, não é uma especialista na instalação e manutenção das máquinas que utiliza em suas linhas de produção. Se, por exemplo, existe um projeto de expansão de uma de suas linhas de produção, será necessário buscar novas máquinas com os fornecedores, fazer adequações na fábrica, descrever processos, elaborar rotinas de trabalho, contratar e treinar pessoal, além de muitos outros detalhes. Essas seriam as áreas nas quais não há pleno domínio, sendo necessário buscar mais elementos, necessários para a tomada de decisão. Essa realidade aumenta o risco do projeto e o tempo de planejamento do mesmo. Por conta disso, para essas organizações torna-se necessário levantar dados e informações sobre o projeto e realizar um planejamento inicial que dê elementos mais sólidos para que a direção da empresa possa realizar essa tomada de decisão. Tudo se passa como se nessas empresas fosse necessário antecipar uma parte do trabalho de planejamento, o suficiente para ter em mãos certos elementos vitais do futuro projeto como, por exemplo, a EAP, o orçamento e o cronograma do mesmo. Obviamente, dentro de um tempo determinado, isso é feito em várias rodadas, debatendo diferentes alternativas e opções, até encontrar a melhor versão de planejamento possível. Portanto, após esse trabalho, é obtido o melhor planejamento inicial possível do projeto, alguma coisa com um nível de detalhamento superior ao encontrado no Termo de Abertura do Projeto.

Muito bem! Nesse ponto podemos fazer o seguinte questionamento: - E se, após ter sido obtido o melhor planejamento inicial possível do projeto - for verificado que o orçamento excede o valor previsto inicialmente, o prazo é maior do que o estimado e haverá uma necessidade de recursos acima do que tinha sido definido na época do “business case”? Mais uma vez, haverá respostas diferentes para empresas diferentes. Em algumas empresas a direção forçará o projeto a trabalhar com os números inicialmente previstos, mesmo que o melhor planejamento inicial esteja dizendo que isso não é suficiente. Infelizmente, devido a arrogância de muitos chefes, essa não será uma decisão de poucas organizações. Outras empresas solicitarão ao gerente de projetos que reveja seus números, colocando até um pouco de pressão para que esses números (custos, prazos, recursos) se alinhem com as previsões iniciais, mas respeitarão os números finais obtidos pelo gerente de projetos. Sendo assim, se houver recursos disponíveis na empresa o projeto seguirá em frente, com as modificações definidas pelo planejamento inicial. Caso não haja dinheiro, pessoal disponível e tempo, o projeto será engavetado, até segunda ordem. Afinal uma decisão dura, mas muito honesta.

Bem, foi possível notar que houve uma armadilha gerencial no caso anteriormente apresentado. Para não cair nessa armadilha, muitas empresas entenderam que, antes de emitir o Termo de Abertura do Projeto – que pertence a etapa de iniciação do projeto – precisam também obter o melhor planejamento inicial do projeto, mesmo que esse não pertença formalmente aos processos de iniciação do projeto.

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